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Tragédia de Brumadinho completa um ano - O mesmo dia 25 todos os dias

Vítimas do desastre provocado pelo rompimento de Barragem da Vale relatam indignação, medo e depressão econômica que impedem a população de superar as dores

Por Hélio Rocha, Especial para Plurale

De Brumadinho (MG)

No próximo dia 25 de janeiro, será completado o primeiro ano do maior crime ambiental da mineração brasileira, quando a barragem do Córrego do Feijão, controlada pela mineradora Vale, rompeu-se no início da tarde, vários operários trabalhavam na área, fazendo com que toneladas de lama se espalhassem por toda a região. Mais de 600 pessoas trabalhavam naquela unidade, muitas delas que estavam num refeitório para 200 pessoas logo abaixo da barragem. Além do refeitório, estavam ali também diversos edifícios administrativos e seus funcionários. O saldo da negligência com a segurança da estrutura de contenção de rejeitos de minério, além da inexplicável logística de se colocar áreas de convívio na linha direta de um eventual ponto de ruptura, foi a morte de mais de 250 pessoas e outras dezenas de desaparecidos. O Ministério Público de Minas Gerais realizou entrevista coletiva nesta terça-feira, em Belo Horizonte, na qual o Procurador Geral de Justiça de Minas, Antônio Sérgio Tonet, anunciou que buscará punição exemplar não só para Vale, mas também para a empresa de consultoria alemã Tüv Süd, que atestou a segurança da barragem. Ao apresentar hoje (21) detalhes da investigação sobre a tragédia de Brumadinho (MG) que levou à denúncia contra 16 pessoas por homicídio doloso, o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) sustentou "que houve um conluio entre a mineradora Vale e a consultoria alemã Tüv Süd. Conforme a acusação, ambas as empresas tinham conhecimento da situação crítica da barragem que se rompeu, mas não compartilharam as informações com o poder público e com a sociedade e assumiram os riscos".

Familiares, amigos e outras centenas de cidadãos se unem pedindo Justiça e reparação aos atingidos, não somente às famílias das vítimas fatais e desaparecidos, mais às milhares de pessoas que foram afetadas, como as pessoas que viviam da atividade econômica proporcionada pela Vale e os agricultores que viviam às margens do Córrego do Feijão. Com a lama que correu desde a barragem rompida, ele foi contaminado junto, também, ao lençol freático, impedindo as atividades de centenas de agricultores da região.

Os mesmos fatos de Mariana, ainda interminados porque não completamente reparados os danos provocados pela barragem de Fundão, da Samarco, repetem-se agora em Brumadinho. O impacto social é bárbaro comparado a Mariana, com centenas de mortes contra 19 vítimas fatais e dezenas de desabrigados neste último, mas o impacto ambiental do primeiro é maior, visto ter atingido um dos principais mananciais da região Sudeste, o Rio Doce. Juntos, os dois consolidam a maior catástrofe ambiental da História do Brasil, ambas enquadradas por seu aspecto criminal pela negligência para com a construção e manutenção das barragens, e tendo, inclusive, a Vale por corresponsável em Mariana, visto a Samarco ser uma holding dela própria com a australiana BHP Billiton.

No relato dos moradores de Brumadinho, sobretudo dos atingidos, fica uma insistente e indignada afirmação “aquele dia 25 a gente vive todos os dias”, ou seja, completa-se um ano sem que as dores e angústias daquela tarde saiam da cabeça das pessoas e, portanto, do dia a dia de Brumadinho e áreas rurais próximas. Desde então, projetos culturais foram lançados para dar apoio aos cidadãos locais, principalmente os familiares e amigos das vítimas. Movimentos de negociação com a Vale, pedindo reparação pelos danos sociais, ambientais e econômicos causados, foram estabelecidos, mas diversos moradores seguem sem receber o que foi prometido. Mais uma vez, Mariana se repete.

Um homem que preferiu apenas se identificar como Jefferson, parente e amigo de várias pessoas mortas no rompimento da barragem, afirma a Plurale que várias preocupações, ansiedades e revoltas permeiam o imaginário dos moradores de Brumadinho e áreas rurais próximas. “A barragem rompeu ao meio dia e vinte e oito, do dia 25 de janeiro do ano passado. Desde aquela hora, a gente acorda, almoça, trabalha, janta e dorme o dia 25. As reparações são poucas, e tem coisas que revoltam. A Vale paga um valor maior às vidas que se perderam dentro da sua área, como se vida pudesse medir valor. Ao mesmo tempo, paga pra uns e não pra outros, tem gente indiretamente atingida que já recebeu, outras vítimas diretas que não. E sempre menos do que deveria”, protesta Jefferson.

Outra preocupação apontada por Jefferson é quanto à contaminação das águas e do ar na região. “Até hoje não foi emitido nenhum laudo de segurança sobre a água e o solo, pelos resíduos deixados, e do ar, pela poeira que se vê até hoje nas áreas atingidas”. A narrativa de Jefferson vai ao encontro daquela do agricultor Rogério Resende, 33, que conversou com Plurale e relatou o drama dos trabalhadores rurais que dependem da água do Rio Paraopeba, contaminado pelo Córrego do Feijão, e estão proibidos de usá-la. “Eu não posso mais trabalhar no meu terreno, porque estou proibido de usar a água do rio para irrigar minhas plantas. A Vale não se manifestou nem tomou nenhuma providência em relação aos meus prejuízos financeiros. Ligo e nunca tenho retornos”. Enquanto isso, Rogério relata que vive de pequenos trabalhos. “Preciso de uma luz no fim do túnel, se vou ter uma resposta sobre quando vou poder retomar o meu trabalho.”

Apoio importante dos trabalhadores da cultura

Além de cidade mineradora, Brumadinho sempre foi conhecida por sua identificação com a Cultura, desde a abertura do espaço Inhotim, que mistura conservação ambiental com arte contemporânea para formar um dos maiores museus a céu aberto do mundo. O evento “Arte abraça Brumadinho” vem ocorrendo desde os primeiros meses após a tragédia, e em dezembro celebrou sua 5ª edição, já tendo contado com a participação de renomados artistas brasileiros, como o maestro João Carlos Martins, o violinista Marcus Viana e o cantor Sérgio Pererê.

Neste fim de semana, de sexta até domingo, haverá apresentação da peça teatral de bonecos, "Paraíso mais belo do mundo", voltada para crianças como parte do "Arte abraça Brumadinho".

Uma das estrelas do evento de dezembro foi Mariana Nascimento, menina de 13 anos que perdeu o pai, Denilson Silva, na lama da Vale. O pai era músico, sambista, e a tristeza se apossou da família, que possivelmente não veria mais seus acordes nos domingos à tarde. A garota, no entanto, enfrentou a dor para seguir os passos do pai e se apresentar no festival, cantando com a companhia do violino de Marcus Vianna.

"Junto com a ação de cantar me vem um sentimento de alegria. De felicidade. Eu me sinto bem cantando", diz Mariana, à organização do evento. A mãe, Claudiana, explicou também à organização como a música tem transformado a relação de Mariana com a tragédia. "Mariana nasceu no berço da música. Eu quero que ela sirva de exemplo, como tem sido, que a música pode salvar, transformar. Que a música pode dar alegria para as pessoas e eu sinto a alegria da minha filha cantando.”

Veja aqui o vídeo da apresentação de Mariana Nascimento.

O “Arte abraça Brumadinho” tem, também, produzido diversos vídeos institucionais, com conteúdo que mistura a denúncia e o amparo aos atingidos de Brumadinho, e conta com uma página no Facebook com todos os materiais até o momento produzidos, além do registro dos eventos.

Vale e Justiça foram procuradas por Plurale

A Vale dedica uma página na internet dedicada exclusivamente a divulgar suas ações de reparação aos atingidos de Brumadinho. Procurada por Plurale, reproduziu o que vem sendo divulgado em seus canais, argumentando, quanto às indenizações, manter ajuda emergencial a 106 mil pessoas, tendo realizado 723 acordos de indenização que beneficiaram 2.300 pessoas, além de outros 516 acordos trabalhistas que beneficiaram 1.539 pessoas.

Também afirma que que vem desenvolvendo um amplo projeto de recuperação ambiental da área atingida, com revegetação e um plano responsável para preservação futura do meio ambiente, nesta e em outras áreas onde há vegetação vizinha a operações da empresa. Igualmente, se compromete a revisar a segurança de todas as barragens e abolir o método de construção por alteamento a montante, considerado por analistas um dos responsáveis pelas rupturas de Brumadinho e Mariana.

A Tüv Süd emitiu nota dizendo-se ainda consternada pelo fato, mas afirmando que, diante das investigações sobre responsabilidade ainda em curso, prefere não fornecer mais informações sobre o processo e sobre os laudos emitidos. No entanto, frisou estar colaborando com a Justiça para melhor compreender os possíveis quais foram os erros cometidos pela empresa.

Contato para indenizações

De acordo com a Vale, os escritórios para pedido de indenização estão nas cidades de Brumadinhos, Macacos, Barão de Cocais e Belo Horizonte. Há uma documentação que deve ser apresentada. A lista de documentos e os endereços estão disponíveis aqui.

Foto do Corpo de Bombeiros MG/ Divulgação







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