Texto e fotos por Felipe Araripe e Sônia Araripe, de Plurale
De Fortaleza (CE)
Texto e fotos por Felipe Araripe e Sônia Araripe, de Plurale
De Fortaleza (CE)
O lindo catamarã branco de 30 metros, com muitas placas solares, velas sustentáveis e bandeira francesa, chama a atenção na Marina de Fortaleza. Não por acaso. Dentro da embarcação está o "segredo" que faz deste projeto pioneiro no mundo: o Energy Observer é o primeiro barco no mundo movido a hidrogênio, com zero emissão de gases poluentes e autossuficiente em energia. A embarcação está no Brasil pela primeira vez, ancorada em Fortaleza, onde permanecerá do dia 16 ao dia 24 de novembro. Essa é a octagésima-terceira parada do barco, que já visitou mais de quarenta países, com a missão de sensibilizar e de educar para as urgências das mudanças climáticas e da transição energética.
O Energy Observer é uma embarcação inteligente e revolucionária, que navega sem prejudicar o planeta. A propulsão elétrica é alimentada por energias renováveis, incluindo vento, água e sol. Mas o que a torna única é sua capacidade de armazenar energia sob a forma de hidrogênio - produzido a partir do processo de eletrólise da água do mar, tecnologia que lhe permite ter a total autonomia sem utilizar poluentes. A embarcação é high-tech: a geração de energia é totalmente automatizada; a inteligência artificial entra para adequar as energias eólica, solar e a hidrogênio ao consumo e se alia à experiência de uma equipe de altíssimo nível. Para reforçar a segurança, o processo de produção do hidrogênio só é feito quando o barco está em porto. Victorien Erussard, CEO do projeto (foto abaixo), já é especialista no trajeto transatlântico entre a França e o Brasil; já fez quatro dessas travessias - e conta que traz a experiência da Marinha Mercante e de corridas transoceânicas. Em uma dessas corridas, quando estava em segundo lugar, o motor de seu barco movido a diesel parou e ele percebeu a oportunidade. "Decidi abandonar o esporte para criar novas energias para a navegação".
Victorien Erussard, CEO do projeto
Para quem não sabe, as mais de 100 mil grandes embarcações que fazem comércio exterior emitem 3% de todas as emissões de gases de efeito-estufa. Todas são movidas por combustíveis poluentes. Existem apenas 500 pequenas embarcações experiementais que são movidas a energias renováveis e a gás. A diferença do Energy Observer é que além de ser movido a energia solar e eólica, é o único que utiliza o hidrogênio. Outra tecnologia do catamarã que tem feito diferença é o uso das "ocean wings", ou velas de propulsão, que são uma possibilidade para futuros barcos.
O projeto começou em 2017, com patrocínio de grandes grupos, como o Grupo Accor, a Qair, a Toyota e a Air Liquide. Envolveu investimentos em torno de 6 milhões de euros em pesquisa e desenvolvimento, além de 30 milhões de euros no barco. Como primeiro embaixador dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável estabelecidos pelas Nações Unidas, sua missão é aumentar a sensibilização para as questões de transição ecológica e explorar soluções que provem que outra matriz energética para o futuro é possível.
Um dos grandes diferenciais da embarcação é que possui, como parte da equipe, uma cientista para cuidar do desenvolvimento tecnológico e também uma jornalista, que produz conteúdo e compartilha todas as práticas sustentáveis nas redes sociais. "Fazemos questão de compartilhar o conhecimento que está sendo gerado com a sociedade", diz Beatrice Cordiano, expert de desenvolvimento sustentável e energia do navio.
Time Accor Américas e parte da equipe do Energy Observer.
Antonietta Varlese, vice-presidente sênior de Comunicação e Sustentabilidade da Accor Américas, na divisão Premium, Midscale & Economy, explica: "Cada vez mais nossos hotéis procuram economizar energia e reduzir custos operacionais; e a parceria entre o Energy Observer e a Accor abre acesso privilegiado à transição energética. Em sintonia com o pioneirismo do Grupo, representa um passo significativo para acelerar a transição energética na hospitalidade necessária para construir nosso futuro."
João Dias, gerente de sustentabilidade da Accor nas Américas, conta que o grupo patrocina o barco desde seu começo. "Procuramos estar na vanguarda, apoiando tecnologia global em busca da meta com que nos comprometemos, do NetZero. Sustentabilidade, para nós todos, está no centro da estratégia de negócios".
Fortaleza e visita à renováveis
A escolha da capital cearense para a escala do barco francês não foi por acaso. A empresa Qair, de energia renovável, uma das patrocinadoras do projeto, tem sede aqui e está usando o projeto como atrativo para apresentar seus novos geradores a hidrogênio e sua tecnologia de ponta neste tipo de solução energética. "Podemos oferecer soluções no Brasil ou para exportação", explicou o Chairman da Qair, Louis Blanchard. A tripulação do barco foi conhecer projetos de energia eólica no Ceará e também de etanol, no interior de São Paulo.
O vice-prefeito de Fortaleza, Élcio Batista, destacou a conexão do Energy Observer com a Agenda 2040 da cidade, com foco em desenvolvimento sustentável e inclusão social. "Precisamos conscientizar empresas e sociedade para a importância de agilizarmos a descarbonização. O petróleo é barato, mas precisamos ter energia renovável a preços competitivos, que gerem benefícios para todos." Várias escolas da região estão sendo convidadas para conhecer o projeto com sua equipe.
Jovem cientista italiana é um dos destaques da tripulação
Beatrice Cordiano, chefe científica do projeto.
A tripulação do Energy Observer se destaca por mesclar a experiência de verdadeiras lendas da navegação transoceânica - como o CEO do projeto, Victorien Erussard - e jovens que trazem o frescor das novas experiências e do conhecimento de novas tecnologias. A chefe científica do projeto é a jovem italiana Beatrice Cordiano, 29 anos, italiana de Torino (foto acima). Em entrevista exclusiva à Plurale, dentro da cabine do barco sustentável, em Fortaleza, Beatrice conta que fez a melhor escolha para sua vida profissional.
"Me formei em Engenharia elétrica, com especialização em renováveis, especificamente em hidrogênio. Trabalhei alguns anos em pesquisa científica na Suíça. Mas sonhava com a oportunidade de poder exercer, na prática, este conhecimento", relata. A cientista chama a atenção não só pelo conhecimento, mas também pela simpatia e beleza. Queimada de sol e descalça, a bordo da embarcação (ninguém entra de sapato no barco), lembra como foi seu encontro com o laboratório. Há dois anos e meio embarcou na tripulação do Energy Observer e está vivendo a aventura de viajar o mundo a bordo do catamarã sustentável. "Gosto de conhecer pessoas, de viver experiências que não teria se estivesse em um laboratório ou em uma empresa tradicional" – declara.
Beatrice revela que a família e os amigos sentem sua falta, mas também entendem que está realizando um projeto não só pessoal, mas pelo futuro do planeta. "Estamos fazendo parte de uma prática importante no sentido da migração para novas bases da economia. As mudanças climáticas já estão fazendo parte do dia-a-dia de todos e precisamos correr para ajudar a humanidade a enfrentar este cenário."
Com números e métricas, a cientista conta que o Brasil tem tudo para se destacar como uma potência neste processo de descarbonização. "É minha primeira visita ao Brasil e estou impressionada com o tamanho e com a qualidade das pesquisas e práticas sustentáveis." Visitou, com a tripulação, uma plantação de etanol e também projetos de energia eólica.
A cientista italiana sorri envergonhada quando perguntamos sobre o seu futuro profissional. "Estarei aqui até o fim desta etapa do projeto. Quem sabe depois tenha um emprego em empresa tradicional?" - pergunta. E nem precisa ter resposta: se ela está feliz? Os olhos verdes brilham ainda mais forte, para assegurar. "Estou vivendo, sem dúvida, os melhores anos da minha vida."
Plurale faz visita a bordo
Tivemos a oportunidade única de subir a bordo do catamarã sustentável na sua única parada em Fortaleza quando esteve no Brasil. Conhecemos o moderno e inteligente sistema de controle das várias formas de combustíveis renováveis - a hidrogênio, eólica e solar. Só se entra no barco descalço ou de meia para não agredir o delicado conjunto de placas solares e para evitar contato de poeira com o ambiente tão limpo. Ao todo são seis confortáveis cabines para a tripulação e também o "conforto" de uma pequena cozinha e "escritório" para que todos possam trabalhar ao longo da viagem. Há conexão de internet via satélite e todos os trajetos são cuidadosamente planejados para procurar garantir viagens tranquilas, sem sobressaltos. Há duas cadeiras para pilotar o barco. Há dois mastros, os "ocean wings", que captam a energia dos ventos. Toda a energia é estocada por equipamentos que ficam na parte interna da embarcação.
O Capitão do navio, Marin Jarry, mostra o moderno sistema de controle.
Projeto 2 em curso
A tripulação revelou que já está estudando apoios para a fase 2 do Energy Observer, com inovação tecnológica e um novo foco: testar a viabilidade não apenas para uma pequena embarcação, mas para um navio de maior porte. A ideia é construir um navio como se fosse de comércio internacional, de uns 160 metros, com capacidade para 40 mil quilos de hidrogênio embarcado - e potência 100 vezes maior do que a do atual Energy Observer. Com exclusividade à Plurale, o Capitão do navio, Marin Jarry, previu que os custos desta nova fase devem girar em torno do dobro dos custos de uma embarcação a diesel.
Serviço
Data: 16 a 24 de novembro
Entrada para a vila de exposições: somente mediante convite
Endereço: Marina Park Hotel, Fortaleza: Av. Pres. Castelo Branco, 400 - Moura Brasil,
Fortaleza – CE.
*A embarcação estará visível, mas não poderá ser visitada pelo público geral.
(*) Plurale viajou em press trip a convite da Accor Américas.