Por Giane Gatti, Colunista de Plurale
Eles estão por toda a parte, basta você olhar para os lados, principalmente o plástico em suas várias categorias. Há ainda o papel, papelão, alumínio e vidro. Vão se acumulando e poluindo, se não forem destinados corretamente. Esse é o trabalho dos catadores e cooperados de reciclagem.
A gestão de resíduos sólidos urbanos (RSU) é um dos graves problemas ambientais no mundo. A oferta de coleta seletiva, separação dos materiais que podem ser recicláveis, chega a somente 14,7% da população urbana no Brasil, segundo a Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente (Abrema). Estima-se que cerca de 33,3 milhões de toneladas de resíduos em geral tiveram destinação ambientalmente inadequada no Brasil em 2022.
"O lixo é uma narrativa sobre pequenos hábitos cotidianos de uma sociedade, é reflexo do que somos e do que temos", Atlas do Plástico/ Fundação Heinrich Böll
No Dia Mundial da Educação Ambiental (26/1), convido você a conhecer um pouco do trabalho das cooperativas de materiais recicláveis. A conscientização passa pelo reconhecimento de quem faz a destinação correta dos resíduos que geramos e pelos quais devemos nos responsabilizar, conjuntamente com as empresas que os fabricam (logística reversa). Já o governo precisa fazer uma gestão mais eficiente dos resíduos e desenvolver programas educativos estimulando a população a separar os resíduos recicláveis para serem coletados.
Luiz Carlos Fernandes foi parar no setor de resíduos por acaso. Ele estava desempregado, quando uma amiga o chamou para trabalhar com reciclagem de PET (usado em garrafas). Depois foi reciclar plástico, que era triturado e vendido para fabricar sacos de lixo. Em 2003, ele e um grupo de amigos procuraram a Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares da Coppe-UFRJ. "Foi um pontapé maravilhoso. Conseguimos nosso primeiro projeto e trabalhamos na Usina Verde, onde era feita a geração de energia elétrica a partir de resíduos", explica. E em 2004 foi criada a Cooperativa Popular Amigos do Meio Ambiente (Coopama).
Luiz Fernandes, diretor da Coopama. (Foto de Giane Gatti)
A cooperativa, que fica no bairro de Maria da Graça, na zona norte do Rio, conta com 86 cooperados (há três meses eram 134), que coletam, separam e destinam 300 toneladas de resíduos sólidos recicláveis por mês. Muitos vieram do extinto lixão de Gramacho, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense. "É admirável o trabalho que fazem. Muitas mulheres identificam o tipo de plástico apenas pelo toque", exalta Luiz, que é um dos fundadores e diretor da Coopama.
O número de catadores reduziu, porque os custos são altos com impostos, contas de luz, aluguel e condomínio, além do valor da venda dos materiais recicláveis que teve queda. A cooperativa recebe até R$ 350 por uma tonelada de papelão e R$ 170 pelo vidro. O ideal seria enviar direto às indústrias, mas geralmente vende a intermediários e o valor recebido é menor. "A estrutura das cooperativas é frágil, pois trabalhamos para ganhar no fim do mês o que vendermos de materiais recicláveis. Pagamos os custos e o que sobra é dividido entre os cooperados. Já remuneramos mais de quatro salários-mínimos por mês, hoje não chegam a dois", afirma. Essa é a realidade da maioria das cooperativas.
Catadora Mariza Amaro (Foto de Giane Gatti)
Luiz cobra mais parcerias e investimentos. "Não temos capital de giro. Para coletar e enviar uma carga do tamanho que as indústrias demandam, seriam dois meses de trabalho e mais dois meses para sermos pagos. Precisamos ter caminhões grandes e há o custo com combustíveis. Quando pedimos que nos ajudem com R$ 100 para o frete, elas negam."
"Ninguém está nos fazendo favor"
Outro aspecto que precisa mudar, segundo ele, é que a maioria das empresas não remunera pela coleta dos materiais, por acharem que o que ganharão com a venda já cobre o serviço. "Não paga nem a mão-de-obra. Eles acham que prestam um favor para a gente. É o mesmo que eu começar a trabalhar na sua casa e você me dar um quarto para dormir e comida. Isso não paga pelo serviço", afirma.
"Valorize quem coloca a mão no lixo por você. As pessoas devem procurar conhecer para entender e valorizar o trabalho desses catadores. O que eles fazem é uma grandiosidade para toda a sociedade", cobra Luiz Fernandes.
Luiz garante que a atividade das cooperativas de materiais recicláveis vai além de prestar um serviço ambiental. "Tem um lado social de geração de renda, pois damos oportunidade a pessoas que dificilmente encontrariam trabalho. Alguns, se não estivessem aqui, estariam nas ruas, buscando outra forma de sustento, então é uma questão de segurança pública. E ao fazer a destinação correta, retiramos os resíduos do meio ambiente e evitamos a proliferação de vetores, da área de saúde pública."
Ele relata histórias de superação como a de um rapaz semialfabetizado que, ao começar a trabalhar na cooperativa, voltou aos estudos, se formou em química e foi contratado pela Usina Verde. E a de uma moça que chegou sem ter onde morar, enquanto trabalhava lá, passou em um concurso público e comprou uma casa.
"O consumo não vai diminuir. A gente está cansado de falar. A população tem muita culpa, por ainda jogar lixo nos valões, muitas vezes devido à falta de coleta seletiva. Em casa, é uma pequena parcela que separa corretamente os resíduos. E o governo tem mais culpa, porque não conscientiza, não cria programas. As leis precisam ser cumpridas de maneira que as empresas destinem os seus resíduos e sucatas às cooperativas", desabafa.
A Coopama oferece palestras, consultorias sobre gestão de RSU e visitas para empresas e escolas. No local, há o Instituto Cult&Art, com obras feitas de materiais recicláveis pelo artista plástico contemporâneo Rogério Campos, onde também acontecem oficinas de artesanato.