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PLURALE EM REVISTA - EDIÇÃO 84 - Os 30 anos da Cidadania que transforma a Solidariedade

POR NÁDIA REBOUÇAS, COLUNISTA DE PLURALE

Dia 19 de setembro de 2023 chegou um novo livro da Ação da Cidadania, agora registrando 30 anos da história do que pode ser o maior e mais planejado projeto social brasileiro. Nasceu das ideias de Betinho, um ser especial que chegou por aqui misturando força, fraqueza e consciência do nosso modelo mental velho, escravocrata, vergonhoso e indigno: aquele que nem percebe a fome!

Sim, ouvi isso algumas vezes: “Não acredito na fome, são é um bando de preguiçosos! No Brasil ninguém passa fome!” No entanto, estão aí os dados que mostram as 33 milhões de pessoas que passam fome em todo o Brasil.

Tem a fome das periferias das grandes cidades, tem a fome do campo. Eu sofria quando pensava na fome, quando via o silêncio da fome no rosto de adultos e crianças, quando escutava a sua quietude dolorosa. Tive o privilégio de conhecer Betinho, o sociólogo que sonhava e agia, e que me convidou (ou será que instigou?) a criar campanhas de comunicação, reunindo todos os publicitários que se entusiasmassem e decidissem usar a comunicação para mudar consciências e mover a sociedade para o serviço de acabar com a fome!

Durante mais de quatro anos, a “Campanha Contra a Fome”, como ficou conhecida, foi veiculada gratuitamente pelos veículos de comunicação. Sem qualquer custo, foi planejada, criada e produzida pelos publicitários e profissionais de marketing que formaram um comitê: o Comitê Ideias. A cultura também formou seu comitê e os artistas estão engajados até hoje .

Betinho foi procurar os empresários e conseguiu apoio que também só se multiplica há 30 anos. Nasceram comitês dentro das organizações, ampliando o voluntariado no Brasil. Ativou-se a solidariedade e ela se multiplicou até no lançamento do Balanço Social pelo IBASE, que pela primeira vez sugeria contar as mulheres e os negros na empresa. Naquele tempo ainda não se falava em diversidade. Tudo é um processo, com a Rio 92 e a Ação da Cidadania, lançado por Betinho e Dom Mauro Morelli. Ali se iniciou a transformação que segue hoje sua intensa jornada.

Na época, chegou-se a um número aproximado: 5.000 comitês. Esses comitês sempre foram e são a alma da Ação da Cidadania, sua força de distribuição. Distribuidores de solidariedade.

A campanha mobilizou grande parte da sociedade. Criou-se então uma nova moeda: alimentos não perecíveis. Saímos do mapa da fome em 2014, mas infelizmente voltamos pra lá! Costumo dizer que quantas vezes a fome voltar, mais motivos teremos para vencê-la! Não é simples mudar a cultura de um país; e este é o trabalho que vem sendo feito pela cidadania, nesses tempos que estou por aqui! “O país não vai mudar pela política nem pela economia, mas pela cultura”, já dizia o Betinho.

Hoje, 30 anos depois, aí está a Ação da Cidadania – que, sem abandonar sua essência, inova todo dia, incorporando tecnologias para avançar na sua missão! Visitei as novas instalações da Ação da Cidadania e registrei os muitos avanços. Estão juntas, no mesmo espaço, as três organizações criadas por Betinho: a própria Ação da Cidadania, o IBASE e a ABIA. E, ao lado delas, a semente das várias sementes: o Instituto Marielle Franco.

O grande galpão para armazenar as cestas básicas para o Natal sem Fome ou para outras emergências está lá, pronto para se encher de dignidade contra a fome. A novidade é que muitos passos foram dados na direção do alimento pronto, para os que não têm nem casa para receber uma cesta básica. Estão espalhados pelas calçadas.

Após a pandemia e o pandemônio que nos assolaram, as famílias e os comitês distribuem também o alimento pronto. Passam pela cozinha solidária e seguem a caminho das ruas, com as caixinhas preparadas com comida de verdade e sem agrotóxicos! A preparação acontece numa cozinha solidária com instalações ultramodernas; utilizam alimentos da horta, sem agrotóxicos, plantados e cuidados dentro das novas instalações. Lá ganhei um saco de verdes e, quando abri, agradeci aos céus os perfumes da fartura que hoje a Ação da Cidadania produz.

Os comitês também distribuem solidariedade e educação. Forma-se uma enorme e bem-sucedida roda de aprendizado. Aprende-se um pouco de tudo. Chefs famosos passam pela cozinha solidária, distribuindo receitas e ensinando o aproveitamento de alimentos.

Comida de verdade. Distribuída por gente de verdade, que chega às pessoas que precisam de alimento de verdade. Assim é a Ação da Cidadania.

Se o Betinho, que teve a coragem e a ousadia de visualizar o sonho, estivesse por aqui (será que não está?), certamente estaria espantado com o mundo louco que construímos após sua partida. Estaria estarrecido com a emergência climática, que certamente vai afetar mais os que menos têm; mas estaria orgulhoso por ver as pessoas nas quais acreditou, que efetivamente fazem a diferença! Honraria e agradeceria aos comitês! Teria um orgulho danado do filho do CA (Kiko, diretor executivo da Ação) e de seu filho Daniel (presidente do Conselho da Ação). Ficaria falando com os jovens e vendo a enorme curiosidade deles pelo começo da Ação da Cidadania, há 30 anos.

Eu tenho orgulho do Daniel e do Kiko, jovens comunicadores da organização e dos comitês! Admiro a forma como souberam multiplicar as ações, inovando e criando, de novo e de novo, a Ação da Cidadania! Agradeço por ter vivido essa história.

Que venha outra vez o fim da fome, para que a ação vá dar cabo das outras fomes que também estão aí para ser vencidas! Esses dias no Rio de Janeiro foram um presente! Renovar a esperança sempre! Se puderem, visitem as novas instalações da Ação da Cidadania e renovem seus votos: vamos acabar com a fome no Brasil e espalhar nossos aprendizados com solidariedade. Imaginemos, sem parar, um mundo sem fome!







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