POR SÔNIA ARARIPE E FELIPE ARARIPE, EDITORA E REPÓRTER DE PLURALE
FOTOS DE FELIPE ARARIPE, DE PLURALE
DO RIO DE JANEIRO
A Ministra do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas, Marina Silva, voltou a defender hoje a criação da estrutura da Autoridade Climática em evento realizado no Rio de Janeiro, na sede do Jornal O Globo. "Há um processo de discussão interna no centro do governo. Não é só a figura da Autoridade para o enfrentamento da emergência dlimática. É uma governança, que pressupõe a figura jurídica de emergência climática, o Comitê Técnico-Científico para dar suporte às ações, o Conselho Nacional de Segurança Climática e também a Autoridade Climática. Então é um conjunto de medidas para tornar cada vez mais robusta a governança para o enfrentamento das mudanças climáticas e do eventos climáticos extremos." Ela reforçou que a ideia de uma Autoridade Climática é mais fácil de ser entendida e por isso tornou-se mais popular, mas "não está separada do conjunto de medidas necessárias para que seja criada".
Marina Silva explicou que tem uma complexidade para esta criação, que é a criação do novo Marco Legal para a figura da emergência climática. "Hoje, temos emergência para quando o desastre acontece. Não há para uma ação antecipada, antes do desastre acontecer. Reiterou que não é hora de discutir onde será desenhada. "Será no Ministério do Meio Ambiente, como a Anvisa cuida da área da saúde, da energia é Aneel e existe uma autoridade também para a área nuclear. É uma autoridade técnica."
Segundo a Ministra, o objetivo não será meramente punitivo, de ser um "xerife do clima", mas frisou, em sua fala no evento, que é muito mais "de formulação, de fazer propostas, novas estruturas, novos processos, trabalhar agendas de mitigação e adaptação", e que é mais barato atuar na prevenção, antes que a emergência climática realmente aconteça. Citou como exemplo a compra de cestas-básicas no caso da seca extrema vivida atualmente na Amazônia, lembrando que levar esta ajuda por rio custaria em torno de R$ 300 a R$ 400, mas encaminhar por helicóptero, quando a seca já aconteceu, chega a ser superior a R$ 2,5 mil. Destacou que para o Orçamento seria melhor prevenir e agir antes do que depois, com o cenário de desastre já deflagrado.
Diante de críticas públicas da oposição de que o Governo não agiu a tempo nas recentes queimadas, a Ministra, na sua fala, defendeu e enumerou as ações realizadas. Disse que nem sempre os cientistas conseguem prever exatamente o começo dos desastres climáticos e que as autoridades vinham há meses agindo sim, em coordenação com governos estaduais e municipais para combater focos de incêndios. Destacou que o Governo e o Ministério interromperam uma escalada de desmatamento de 80% nos principais biomas. E que houve uma conjunção de fatores acontecendo ao mesmo tempo: focos de incêndio, baixa umidade do ar, seca severa nos rios da Amazônia, etc.
Marina Silva completou que o MMA é o "Ministério das grandes coisas" e que "não é para ficar se auto-imolando. Não é para fazer lacração. A política deve ser feita com responsabilidade. É preciso quebrar a inércia do resultado alcançado. Estamos vivendo as emergências climáticas que serão cada vez mais intensas e frequentes."
Perguntada por Plurale se este seria um recado para parte do Congresso, do governo, de adversários políticos, a Ministra disse que "não trabalha com a lógica de adversários, mas sim de debater e resolver o problema. Como fizemos o pacto dos Três Poderes, toda a atenção para as secas e para os incêndios dá conta de que existe um processo e disposição; mais do que para tratar do desastre, mas também para cuidar da prevenção do risco." E que estava se referindo até a ela mesma e ao Ministério. Acrescentou que está trabalhando esta política desde 2023, quando aconteceu o desastre climático em São Sebastião (litoral paulista). "Já discutíamos uma solução para a prevenção." E reforçou que não enfrentar as mudanças climáticas é um risco muito alto.
Questionada sobre a NDC brasileira - sua Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC, em inglês), ou seja, a ambição climática de redução de emissões do país - a Ministra disse esperar torná-la pública em breve. "Para chegarmos no Azerbaijão (onde será realizada a próxima COP-29) com esta meta. Queremos liderar pelo exemplo, reduzindo o desmatamento e ampliando a contribuição para reduzir a perda de biodiversidade . O Brasil tem que fazer isso: apresentar uma NDC ambiciosa para inspirar os outros também .”
O debate foi moderado pela Jornalista Daniela Chiaretti, do Valor Econômico, e contou com as participações do Professor da COPPE, Roberto Schaeffer, especialista em transição energética, pela secretária-geral da Funbio, Rosa Lemos de Sá e por Daniela Lerda, senior fellow do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI).
A secretária-geral da Funbio, Rosa Lemos de Sá, falou sobre o papel do Funbio em 28 anos de atuação. “Para trabalhar com esta agenda seria preciso muito mais recursos. Mas hoje já existe um grande mix de financiamentos de fundos, filantropia, países, governos e empresas.”
Daniela Lerda, Senior Fellow do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI) e representante do Brasil na Nia Tero, acaba de voltar de viagem ao Xingu e contou o que viu na região fortemente impactada pelos focos de incêndio. "Comunidades indígenas estão sendo muito atingidas pelos incêndios e emergências climáticas. No caso do Xingu, são muitas frentes, chegando a 42 territórios.”
O professor Roberto Schaeffer, da Coppe, que trabalha no grupo técnico-científico da proposta brasileira de ambição de redução das emissões, a chamada NDC, reiterou que este tem sido um trabalho relevante a nível global. “ O que o Brasil tem feito é muito relevante do ponto de vista de metas de reduzir emissões. Não posso falar nada além do que o Ministério do Meio Ambiente nos autoriza. Estamos cobrindo todos os cenários. Hoje 50% das emissões vêm de desmatamento ilegal. Acreditamos que até 2030 o desmatamento ilegal acabará. Depois, sobrará orçamento de carbono maior ou menor para outros setores. É isso que estamos mostrando ao Governo brasileiro." O professor alertou que todos os setores da economia brasileira terão que fazer a sua parte. "A questão é que precisaremos que as emissões se tornem negativas a partir de 2040. Então, o setor de energia não poderá ser só renovável. Para termos emissão negativa em energia, precisaremos dos biocombustiveis verdes (os chamados BECCS, na sigla em inglês) . Reflorestamento é outro caminho. As reações são sempre muito fortes. Mas o ponto sobre o qual sempre chamamos a atenção é que o maior custo é não fazer nada. O verdadeiro custo é o da mudança climática. Como as enchentes do Rio Grande do Sul, os incêndios climáticos afetando o agro etc.”